sábado, 21 de junho de 2008

Simulacro e poder: uma análise da mídia



Marilena Chauí é professora titular do Departamento de Filosofia da USP, especializada em História da Filosofia Moderna e Filosofia Política. Autora de inúmeras obras, membro fundador do Partido dos Trabalhadores, escreve o livro “Simulacro e poder: uma análise da mídia” (2006) a partir de atualizações e acréscimos feitos à conferência proferida no Ciclo Rede Imaginária, na Casa da Gávea, em 1993.

Como grande maioria da população brasileira aprecia programas de auditório, com jovens e crianças, desconhecidos ou celebridades contando suas preferências pessoais desde o sexo até a culinária, expondo suas intimidades, Chauí identifica nesse tipo de espetáculo o caráter de consultório midiático – sentimental, sexual, gastronômico, geriátrico, ginecológico, de cuidados com o corpo, entre outros.

Nestes cenários, perguntar sobre o que os entrevistados sentem e acham têm sido mais importante do que perguntar sobre o que pensam ou como julgam fatos, como significam acontecimentos e contextos político-econômicos. Tragédias pessoais e confissões domésticas se tornam populares. “Os assuntos se equivalem, todos são questão de gosto ou preferência, todos se reduzem à igual banalidade do “gostou” ou “não gosto”, do “achei ótimo”, ou “achei horrível” (p.7)”.

A autora se apropria dos conceitos de credibilidade e confiabilidade utilizados por Christopher Lash (1983) em seu livro A cultura do narcisismo. Quando os fatos cedem lugar a declarações “personalizadas”, convertem-se em propaganda. Devido ao apelo à intimidade, à personalidade, à personalidade e à vida privada, a propaganda transmuta-se, de forma ilusória, em informação. As relações sociais e políticas ficam dissimuladas quando se abole a distinção entre o espaço público e privado, dissolvendo a opinião pública. A manifestação pública dos sentimentos ocupa o seu lugar. “A opinião pública era um juízo emitido sobre uma questão relativa à vida política, era uma reflexão feita em público, era uma reflexão feita em público e por isso definia-se como uso público da razão e como direito à liberdade de pensamento e de expressão” (p.10).

São três os deslocamentos percebidos: o primeiro, substitui a idéia de uso público da razão; o segundo, o direito de cada um e de todos de opinar em público pelo poder dos “formadores de opinião’; terceiro, a ocupação do espaço da opinião pública por profissionais dos meios de comunicação formados por oligopólios com uma dúzia de conglomerados com alcance global”.

O jornalismo também sofre mudanças. Segundo Chauí, as notícias têm sido apresentadas de forma precária. “Rápido, barato, inexato, partidarista, mescla de informações aleatórias obtidas e pouco confiáveis, não-investigativo, opinativo ou assertivo, detentor da credibilidade e da plausibilidade, o jornalismo se tornou protagonista da destruição da opinião pública” (p.14).


Penso que as atividades mídia-educativas possuem o mérito de priorizar discussões sobre o senso comum, sobre nossos sentidos, achâncias e opiniões, procurando qualifica-las, contextualiza-las e historiciza-las.
Crédito da foto: Lícius Bossolan